Tuesday 1 July 2014

Capítulo 59 - Conhecendo o desespero




Existem muitos tipos diferentes de guerreiros, aqueles que lutam dependendo de suas habilidades apenas, que não se deixam levar por sentimentos, aqueles que precisam estar com suas emoções no limite, seja o desejo de proteger algo ou simplesmente a fúria e ódio, um instinto assassino voltado contra qualquer ser vivo, os que lutam usando sua experiência, e aqueles que lutam de modo racional, estrategistas, Simone encaixava-se neste último tipo.

Simone nunca tinha estado antes em uma situação como esta, lutando diretamente contra um inimigo mais poderoso e sozinha sem poder contar com a ajuda de ninguém. Por ter habilidades de cura era sempre usada apenas como suporte durante as missões que fazia para a Vama Marga.
Era natural afastá-la das batalhas, uma vez que caso ela fosse ferida não poderia cumprir sua função de curar os outros membros da equipe, sua habilidade era muito valiosa para que ele morresse em uma missão qualquer.

Entretanto, Strauss tinha sido muito cauteloso com ela, imaginando que um dia ela podia ficar sozinha no campo de batalha após perder o resto da equipe, ou mesmo sendo afastada dos outros por algum inimigo, era preciso que ela soubesse o que fazer e pudesse defender-se sozinha.

Desse modo ele tratou de treiná-la muito bem, fazendo-a estudar táticas militares e estratégia, de modo que ela pudesse entender a situação durante a luta e saber se deveria recuar ou avançar, como reposicionar a formação de ataque. Além disso, Simone atuava na base central da organização e lá cuidava do treinamento dos jovens recrutas.

Ao ensinar-lhes táticas de ataque e defesa ela conseguia perceber muitos detalhes, vícios que todo guerreiro tem, trejeitos do corpo antes de atacar, sinais que mostrava medo, duvida, como distinguir uma fita de um golpe real. Simone era muito intuitiva, e era nisso que Strauss confiava, que ao fazê-la treinar os jovens ela pudesse aprender táticas de batalha sem precisar se arriscar.

Simone havia se tornado bastante hábil em teoria, mas agora era o momento de colocar tudo em prática, ser testada de verdade contra um inimigo muito mais poderoso do que ela.

Primeiro era preciso controlar seus sentimentos, o medo e excitação naturais da batalha atrapalhavam seu discernimento, podiam fazê-la agir de modo apressado ou impulsivo, era preciso permanecer calma, fria, não deixar o inimigo a controlar por seus sentimentos. Entregar-se a fúria e a raiva e deixar o adversário ter controle sobre você, alguém furioso ataca com tudo, não se preocupa com a defesa ou com um possível contra ataque.

Com calma ela tentava entender toda a situação. Era natural supor que naquele ambiente e pelas reações que tinha tido que Sallos pudesse ler sua mente, então primeiro era preciso impedi-lo de fazer isto, em seguida começar a traçar uma estratégia de combate.

Ela lembrou-se uma das técnicas secretas da Vama Marga, “Fechar o coração”, entrar no Koori no Sekai, o mundo de gelo.

Tratava-se de alcançar um estado mental superior, chegar a um nível de iluminação capaz de suprimir todo o ego, as emoções tornavam-se coisas vãs, sentimentos positivos e negativos não podiam mais ser percebidos, era como uma hibernação da alma, um mundo de gelo onde não existe mais nada, o resto do universo é percebido como se fossem fantasmas, figuras amorfas.

Embora ainda bastante jovem Simone já era capaz de dominar esta técnica. Desse modo ela impedia Sallos de ler sua mente.    

Estava naquele grande vazio, um lugar que não sabia as dimensões reais, que possivelmente podia ter seu relevo e demais características controladas pelo adversário. Mas mais importante, aquele lugar tinha lhe roubado todas as sensações.

Não era apenas um lugar escuro onde ela tivesse que lutar sem poder confiar nos olhos, para isto ela estava treinada, podia confiar em seus outros sentidos.

Todos os seus sentidos haviam sido roubados, certamente isso fazia parte da estratégia do inimigo, não saber de nada, não sentir nada era uma situação desesperado, coloca uma severa pressão mental em qualquer um.

Nem mesmo esperar ser golpeada para então contra atacar era uma opção, nem mesmo o tato ela tinha, podia ser atingida, alias, podia já ter sido atingido e estar seriamente ferida e não saberia disso. Naquele território o inimigo tinha o controle total, ele a faria sentir o golpe apenas se assim desejasse, mostrando seu lado sádico.

Tentar mudar o cenário da luta não parecia ser uma opção, isto na verdade era outro fator de preocupação e estresse mental, era preciso apenas vencê-lo para sair daquele lugar ou ao contrário, se o derrotasse aquele espaço desaparecia com ela junto, sendo este o caso ela precisaria fazê-lo a libertar primeiro. Mas isto não era uma opção, para fazer isso era preciso dominá-lo de modo absoluto.

Era preciso focar primeiro na luta, encontrar um modo de vencê-lo, então pensar em como escapar dali.
O inimigo estava ao redor, mas ela era incapaz de determinar onde ele estava, nesse caso atacar para todos os lados e esperar eventualmente acertá-lo era a opção lógica e natural, embora tivesse muitas falhas, o gasto de energia seria enorme, além disso a deixaria vulnerável a contra ataques.

É preciso analisar todo o cenário, pensar em tudo que já aprendeu sobre o inimigo, as táticas de tortura e punição dele baseavam-se em situações de angustia mental, uma indecisão e duvida que atormentem a mente ate fazê-la ruir.

Alguém que ataca desse modo mostra-se sádico e paciente, quer apreciar a dor das vitimas, nesse caso atacar aleatoriamente não seria a melhor opção, provavelmente ele apenas esperaria ela esgotar toda a sua energia para então atacar.

Em apenas um momento ele havia demonstrado perder a calma e agir de modo impulsivo, quando ela o desafiou, ele considerou uma terrível ofensa, um crime terrível, ele era alguém bastante orgulhoso e que desprezava bastante os humanos, sim, esta era a chance que Simone estava esperando, ela podia usar isso a seu favor.

Libertou-se então do Koori no Sekai, e começou a gritar, mesmo que não pudesse ouvir sua voz e ela parecesse não sair, sabia que Sallos podia ouvi-la.

Chamou-o de covarde, disse que um anjo caído tinha medo de confrontar uma mulher humana sozinha mesmo naquele lugar onde ele tinha o total controle e todos os tipos de vantagens, talvez ele temesse ser derrotado.

Sallos sabia que era uma armadilha, era claro que Simone ia tentar fazer ele se aproximar para então acertá-lo. Mas seu orgulho não permitiria que ele recusasse este desafio, ele era um anjo caído, não podia temer um humano, um leão não teme um rato.

Com grande velocidade ele avançou diretamente ate Simone, pouco importava que ela esperasse pelo ataque, sequer o sentiria, só depois ele a deixaria sentir dor, sim, com um soco ele destruiria as costelas dela, faria com que perfurassem o pulmão, e então ela morreria afogada no próprio sangue.

Quando se aproximava de Simone podia ver, ela tentava com os braços cruzados defender o tórax, evitando assim golpes em uma região vital, mas isso seria inútil, os golpes dele destruíram os braços dela.
Um sorriso maléfico estava no rosto de Sallos, ele estava a centímetros de Simone, foi acertado por um violento chute na face que o atirou a vários metros de distancia. Mas o pior veio depois, ele sentiu o gosto do próprio sangue, sua boca sangrava, o golpe da humana o tinha ferido.

Novamente Sallos avançou de modo furioso, mas nenhum de seus ataques conseguia acertar Simone, que no fim o acertou com outro chute no rosto.

Ele rangia os dentes de raiva, não conseguia entender como ela se esquivava dos ataques dele, aquele ambiente roubava-lhe todas as sensações, além disso, ela estava o provocando, esperava ele se aproximar ate o limite para esquivar dos golpes.

Ela estava brincando com ele, como isso era possível? Como ele suportaria viver com esta mancha? Ter sido ferido por um humano era algo repulsivo.

Mas não podia continuar descontrolado, estava fazendo movimentos largos, facilitando ainda mais os contra ataques, Sallos respirou e decidiu tentar se acalmar.

Simone sabia que Sallos era um lutador agressivo, que os danos que ela causava a ele eram mínimos, e que no momento em que ele se acalmasse voltaria a dominar a situação, ele era muito mais poderoso, com um único ataque bem sucedido poderia reverter todo o fluxo da batalha.

Embora ele pudesse controlar os sentidos dela havia algo que os anjos não podiam fazer, ter controle sobre a alma humana, porque ele é a essencial do próprio Deus. Ela expandia sua alma, manipulava-a em torno do corpo formando uma espécie de aura, e usava esta aura para detectar os movimentos de Sallos.

No momento em que ele entrava no raio onde a aura dela era emanada ela o percebia, podendo se preparar e atacar, mas para isso era necessário expandir muito a sua energia espiritual, o que a deixava bastante cansada, se a luta se prolongasse para uma batalha de resistência não haveria como vencer.

Sallos já havia conseguido se acalmar, embora não tivesse experiência em lutar contra humanos, tinha entendido que de algum modo Simone usava a alma como arma, afinal isso seria a única coisa que um humano tem capaz de ferir um anjo.

Agora de modo sério Sallos se via obrigado a reconhecer a força do oponente, que tinha sido superado pela estratégia daquela humana. Em sinal de respeito ele agora lutaria usando sua força total.

Imediatamente Simone sente aquela força presença, era como se existisse uma grande chama em meio àquela escuridão, as asas ate então escondidas manifestaram-se, a energia que emanava do corpo dele fazia uma pressão incrível sobre ela, quase a esmagava.

Com um simples bater de asas ele atirou Simone vários metros para trás, e antes que ela pudesse se defender voou ate ela e atingiu com o soco  no estomago, se não tivesse se defendido com a aura o golpe teria trespassado a barriga dela.

Mesmo assim ela estava em péssimo estado, toda aquela estratégia, a preparação, os planos não haviam servido para nada, isso tudo não era suficiente para superar a força de um anjo.

Para ela que nunca tinha estado em uma luta mortal antes esse era o momento de conhecer o desespero que se sente ao enfrentar um adversário mais poderoso, que somos incapazes de vencer.   

2 comments:

  1. Otimo capitulo, apresentou Simone como grande estrategista, mantendo a calma e tentando manipular Sallos que não admitia que um humano o colocasse em causa, o seu orgulho fez com que ele sofresse um golpe mas no final ele feriu-a com apenas um bater de asas o que mostra o poder dele que é muito superior, ancisosa pelo próximo, quero muito ver como o combate vai terminar.

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  2. Bati palmas aqui para a Simone! Mesmo sendo aquela do grupo que mais teria chances de sucesso em uma batalha, ela conseguiu acertar Sallos. Muitas vezes a inteligência pode superar a força... A calma durante uma luta é realmente essencial, porque é muito difícil conseguir analisar uma situação quando se está com os nervos à flor da pele.
    Parece que Sallos a subestimou bastante por ser uma humana, mas creio que mesmo com esses danos que ela levou, poderá utilizar as habilidades de cura que ela tem. Ela parece ser uma pessoa bem focada, creio que mesmo a luta sendo difícil, ela ainda terá vantagem.
    Muito bom o capítulo! Quero ver como será o desfecho dessa luta XD
    Vou ler o próximo nesse instante!

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