Capítulo 36 - Destruindo a si mesmo

Layla desenhava antigos símbolos de poder e entoava orações, usava o pouco de humano e muito de demoníaco que existia em sua alma para criar um portal para o inferno.

Ao ver que o plano de Zeno tinha falhado com a chegada dos anjos Layla havia decidido voltar ao inferno, dizer que o tempo todo tinha apenas espionado os planos dele. E agora para retornar oferecia aquela garota que parecia ter tanta importância para Zeno.

Quando o portal finalmente se abriu uma grande surpresa, um jovem saiu dele. Estava bastante ferido, em péssimas condições, mesmo assim tinha um olhar altivo e orgulhoso.

Logo que saiu usou um golpe onde disparava com o poder da sua alma, imediatamente matando Layla. Entretanto antes do portal se fechar três demônios atravessaram, estavam seguindo o jovem.

Katherine estava confusa com tudo aquilo, mas ela já havia tomado sua decisão quando entregou sua alma a Icelo, iria parar de resistir e começar a ceder espaço para o seu lado sombrio.

Com tudo que aconteceu com Zeno, o que ela tinha ouvido dele, as revelações sobre esta guerra e o futuro da humanidade caso qualquer um dos lados vencesse, era hora dela parar de ter medo e fazer algo para ajudar. Mark e Zachary não poderiam vencer sozinhos.

Após um último instante em que se lembrou de Mark, e do beijo que haviam dado, Katherine decidiu aceitar que as sombras tomassem o controle.

A mudança logo se notou, no seu olhar, no jeito de caminhar, em cada mínimo detalhe, era como se agora fosse outra pessoa. Com uma força assustadora ela instantaneamente matou dois demônios, deixando o outro retornar para o inferno para que desse o recado a seu mestre de que Lilith estava viva.

O jovem que tinha atravessado o portal tentava com muito esforço permanecer de pé, claramente estava ferido, mas havia algo mais.

Quem é você? – perguntou Katherine

Meu nome é Dante Holger. Não sei qual é o seu plano ou objetivo nisso tudo, mas eu não vou de novo ser usado por vocês nessa maldita guerra. – disse Dante

– Pelo contrário, acho que temos os mesmos inimigos, o que faz de nós amigos. Como prova de boa vontade vou ate salvá-lo.

– Eu dispenso sua ajuda, dou valor suficiente a minha alma para isso.

– Sua alma. Hahahaha Você é mesmo engraçado, pelo que posso ver você passou uns bons anos sendo torturado no inferno, alem disso tem usado sua alma como arma. Já disparou mais do que devia com certeza. A verdade é uma só, você não tem mais alma para ser salva.

– Então porque eu não deveria disparar o que resta dela e tentar pelo menos te matar também?

– Porque o que você realmente quer é vingança, não importa o preço que tenha que pagar por isso.

– Então eu vou me tornar um monstro, uma espécie de vampiro de almas?

– Algumas coisas não podem ser consertadas, você esta danificado para sempre. O único conforto que encontrará no que resta da sua vida é entregá-la a vingança. E no fundo eu sei que quer isso, deixar de ser quem ainda é, esquecer tudo.

Dante não respondeu, o vazio em seu olhar que logo foi preenchido por lembranças sombrias e ódio, era a resposta que Katherine precisava.

Depois de algum tempo Dante despertou, Katherine estava ao seu lado, com um sorriso diabólico no rosto. Ele tentou se levantar mais não conseguia, estava sentindo vertigens, desorientado, memórias estranhas, flashes de rostos que nunca tinha visto. Algo havia mudado dentro dele.

Antes que ele perguntasse ela começou a responder o que tinha feito. Todos aqueles anos sendo torturado, e depois ter queimado sua própria alma usando-a como arma tinham deixado Dante vazio.

Um vazio que o engoliria, que precisava ser preenchido com outras coisas, por almas. Katherine havia roubado a almas de algumas pessoas e as dado para Dante, ele começava a sentir o efeito da recuperação, ao mesmo tempo em que perdia a si mesmo, via sua consciência e personalidade se misturarem as das pessoas que perderam seus espíritos.

No fundo aquilo não incomodava Dante, ele não tinha lembranças que quisesse preservar, preferia esquecer tudo, só queria poder seguir em frente com sua vingança contra anjos e demônios. Tudo que tinha acontecido, o que destruiu sua vida e a da sua família foi culpa deles. No meio de sua guerra eles destroem vidas e nem sequer se importam.

Ele sabia o motivo daquela garota o ter ajudado, ela precisava de ajuda, do poder dele, um humano capaz de matar anjos e demônios. Por mais que odiasse a todos da espécie dela sabia que ela seria útil, que podia ajudá-lo, e quando não servisse mais ele a mataria.

No inferno gritos e suplicam eram ouvidos, tantas vozes que se tornavam em um coral entoando baladas de desespero.

Gremory torturava dezenas de demônios, a ideia de quem alguém havia escapado do inferno era inconcebível. Embora a importância do prisioneiro não fosse muita isso era algo que não seria tolerado.

A sessão de tortura foi interrompida com a chegada de um demônio bastante ferido, ele trazia noticias sobre aquele que havia escapado, fazia parte de um dos grupos que tinha saído em caça dele. Mas agora retornava sozinho e com noticias que trariam sombra e dúvida sobre o senhor do inferno.

Senhor Gremory o prisioneiro escapou, nos o seguimos ate o mundo dos homens, íamos persegui-lo, mas fomos impedidos. – disse o demônio

Espero que não tenha vindo me dizer que quatro demônios foram mortos por um humano. – disse Gremory

– Não senhor, o humano conseguiu matar um de seus perseguidores, mas quem realmente nos deteve foi uma humana, quer dizer ela parecia humana, mas tinha uma essência de anjo caído. Ela dizia se chamar Lilith.

– Isso é absurdo, a princesa esta morta. Você não vai levar esta historia adiante, não perturbaremos lorde Lúcifer com coisas assim.  

A conversa deles é interrompida pela chegada de uma figura imponente, Vassago, um anjo caído, um dos maiores na hierarquia infernal, conhecido por ser o servo mais leal de Lúcifer.

Não cabe a nenhum de vocês julgar o que é ou não do interesse de nosso senhor. Conte-me tudo que sabe demônio e eu reportarei a Estrela-da-manhã. – disse Vassago

Depois de escutar o relato do demônio Vassago partiu para se encontrar com Lúcifer, pouco tempo depois foi enviado um chamado para todos os anjos caídos, um conselho seria formado para ouvir ordens diretas de Lúcifer.

Entre a corte infernal existia grande agitação, era muito raro o Primeiro dos caídos organizar algo desse tipo, na maior parte do tempo ele deixava os anjos caídos livres para fazer o que quisessem com as regiões do inferno que lhes cabiam por direito. Vários deles sequer o viam há séculos.

Quando finalmente foram reunidos em um grande salão todos se curvaram diante de Lúcifer, era uma figura bela, resplandecia como um sol no meio da escuridão, apenas por vê-lo podia-se ter a certeza de que tinha sido a primeira e mais perfeita criação de Deus.

Ele apenas sussurrava algumas palavras no ouvido de Vassago que as repetia para todos os presentes. Lucifer ordenava que um grupo de anjos caídos fosse a terra e trouxesse a garota que afirma ser sua filha, deveria ser trazida sem danos ao inferno.

Logo inicia-se uma grande agitação, a maioria discordava disso, sabiam ou pelo menos desconfiavam dos rumores envolvendo o “último presente de deus”, a qualquer momento a longa trégua podia terminar e uma nova guerra começar.

Neste momento Lucifer se levanta do trono onde estava, mesmo sem elevar a voz sua simples presença intimida a todos, quando começa a falar as paredes tremem, um poder imenso que faz desmaiar os demônios que estavam no local servindo os anjos caídos. Com essa demonstração de poder fez que todos os questionamentos cessassem, voltou a se sentar e Vassago continuou a dar as ordens.

Enquanto isso na livraria, Mark estava estudando, Zachary havia iniciado um pesado treinamento, tentando ensinar o máximo que pudesse a ele no tempo disponível. Quando subitamente ele parou.

Mark havia sentido algo, sabia que tinha acontecido alguma coisa com Katherine, como um som abafado, um grito que ecoava e ia aos poucos desaparecendo ate se tornar inaudível. A sensação era de que aos poucos ela afundava, se afogava em uma escuridão profunda.

Era como se as sombras que a cercavam finalmente tivessem roubado toda a luz, depois de não conseguir mais lutar o abismo que ela trazia dentro do coração a tivesse engolido.

Algo dentro dele o dizia que havia perdido-a, que onde ela estava ele não poderia segui-la, ela estava agora em um lugar que seu coração não poderia mais alcançar.