Wednesday 15 May 2013

Capítulo 2 - Onde rosas nunca cresceram



Após ver aquele reflexo Katherine gritou e correu, não via nem ouvia nada, apenas passava pelas pessoas como se elas fossem sombras. O primeiro impulso foi correr em direção ao bosque, mas logo lembrou-se dele e mudou de ideia. Não havendo alternativa para ela terminou indo para casa, pelo menos era sexta feira, poderia ficar apenas lá, sem precisar ir a escola no dia seguinte.
Apressadamente entrou em casa, tentando não ser notada, mas logo ouviu uma voz a chamá-la. Sabia que iria ser repreendida e teria que ouvir as reclamações de sempre, mas hoje não, estava sem paciência para aquilo. Na verdade estava a ponto de gritar e enlouquecer, se controlou e conseguiu chegar até o quarto, trancou a porta, jogou-se na cama, e ficou a refletir sobre tudo que havia acontecido durante o dia, sobre toda a sua vida. Ficou olhando para o teto, sentia-se sem energia, tinha medo de fechar os olhos.
Aquela imagem não saia da cabeça dela, aquele monstro, aquele demônio, não ela sequer tinha coragem de pensar nisso. Quem era aquele garoto, porque estava fazendo aquilo com ela, tantas perguntas, tanto medo das respostas ...
Continuou daquela forma por um longo tempo, da última vez que havia olhada para o relógio já eram três da manha. Terminou se rendendo ao cansaço e dormiu por algumas horas, um sono sem sonhos.
Ao acordar viu o quarto bastante bagunçado, coisas atiradas contra a parede, coisas quebradas. Não se lembrava de ter feito aquilo, sentiu tontura, vertigem, algo dentro dela estava diferente.
Enquanto arrumava o quarto e recolhia as coisas caídas encontrou dentro da bolsa um estranho cartão. Era da nova livraria que havia sido inaugurada no dia anterior, logo Katherine percebeu o que aquilo significava.
Saiu de casa sem que ninguém a notasse. Não caminhou muito tempo e chegou a livraria, o local não ficava muito distante, era um prédio antigo, mas muito bonito, lhe chamou a atenção o nome da livraria, Divina Comédia, pela janela do segundo andar ela pensou ter visto alguém a observando. Ficou algum tempo parada em frente, receosa, agora que estava ali não tinha mais tanta certeza se queria entrar, pensamentos de dúvida corriam sua decisão, começou a recuar quando de repente dois clientes saíram de lá, ao ver a porta abrir e lentamente se fechar teve a certeza e que devia entrar agora ou não teria mais coragem de fazer aquilo. Respirou fundo e entrou.

Ao entrar a primeira pessoa que viu foi um velhinho de aparência simpática, ele a olhou de uma forma estranha, um misto de surpresa e medo, instintivamente ela soube que ele via nela a mesma coisa que ela havia visto no espelho. O clima de tensão foi rompido pelo garoto, ele descia as escadas de forma apressada.

Tudo bem velho, ela esta comigo, disse o garoto.
Me desculpe senhorita, não sabia que era amiga do meu neto, pode entrar, fique a vontade, disse o velho, agora já com outra expressão no rosto, mais amistosa, mas ainda tensa.

Ainda com dúvidas sobre se tinha feito a escolha certa indo até lá, mas sabendo que agora não havia mais volta ela foi até o garoto. Mark pediu para que ela o seguisse até o outro andar para que pudessem conversar melhor, então subiram por uma estreita escada.
O outro andar era totalmente diferente do primeiro, enquanto embaixo era limpo e organizado ali em cima era totalmente bagunçado, pilhas de livros espalhados pelo chão, todos parecendo ser bem velhos, por duas vezes ela tropeçou em livros, o lugar tinha uma atmosfera densa e carregada, era difícil de respirar, claustrofóbico, não pode ser apenas a poeira, ela pensou.
Diferente das outras vezes onde ele tinha uma aparência mais relaxada e não parecia tão sério, agora ele estava sério, após derrubar alguns livros que estavam sobre uma cadeira e pedir para que ela se sentasse, ele logo começou a falar.

Fui eu que coloquei o cartão da livraria na sua bolsa ontem, antes de você fugir daquele jeito, (começou Mark, antecipando o que seria a primeira pergunta na metne de Katherine) Eu sei que você tem muitas perguntas a fazer, bem, agora eu responderei tudo que puder. Mark fitou o rosto semi pálido de Katherine, que permanecia em silêncio. Duvidas se formavam em sua cabeça mais rapidamente do que ela era capaz de formulá-las em perguntas).  È difícil de acreditar, contraria toda a lógica, toda a racionalidade. Mas a verdade é que no mundo existe muito mais além do que podemos ver, existem coisas nas sombras (diz ele com uma expressão cada vez mais sómbria), se existem também coisas na luz eu não sei, mas se existirem não se importam muito conosco, estamos sozinhos, ele disse.
Demônios, é disso que você esta falando, é isso que esta dentro de mim? – ela perguntou, com uma voz tremula.
Sim, o que eu fiz foi usar um selo para mostrar a você a face do demônio.
Mas como isso aconteceu, por que comigo?
Geralmente eles se aproveitam de feridas no coração, na alma, sentimentos ruins ou negativos que cultivamos, eles sentem o cheiro disso, os atrai.
Você sabe muito a respeito disso não é? Você é uma espécie de mago ou algo do tipo? Pode tirar isso de dentro de mim?
Eu não sei (quando disse isso ele baixou a cabeça e virou as costas para ela e fitando uma pilha de livros no canto da sala), depende de muitas coisas, há quanto tempo ele esta em você, o quanto ele já corrompeu sua alma, qual a força do demônio. Existem tantos fatores, tantos riscos envolvidos.
Então por que não deixá-lo aqui!(bradou Katherine, já caindo em desespero) Até você aparecer eu nunca tinha tido problemas, se esse demônio esta mesmo dentro de mim que fique, nunca me fez mal algum.
Não é tão simples assim, sabe como demônios se divertem? Corrompendo almas inocentes, eles aproveitam cada minuto, como se aos poucos ele fosse injetando doses maiores de mau, envenenando seu coração. Aos poucos você vai perder o controle, pesadelos, paranoia, vai se tornar uma marionete dentro do seu próprio corpo.

Ambos ficaram em silêncio. Ele tinha medo de encará-la, sentia-se impotente. Ela estava perdida em pensamentos, queria chorar, gritar, uma parte dela queria desistir, apenas assistir a tudo, ir embora esquecer tudo aquilo e esperar pelo fim.
A pequena e abafada sala se tornava cada vez e mais opressiva. Mark então começou a falar, contando sobre o que tinha acontecido no dia seguinte. Depois dela ir embora da sala de detenção gritando, ele teve de explicar ao professor o espelho quebrado e tudo aquilo, como ele teve que se explicar dizendo que estava apaixonado por ela. O professor pareceu gostar daquilo e tudo virou uma conversa sobre hormônios, juventude e primavera, ele tentou fazer piada sobre isso.
Nesse momento ela explodiu, ouvir isso foi demais para Katherine que começou a gritar com ele, empurrá-lo, como ele podia ser tão idiota, fazer piadas e brincadeiras em um momento como esse? Ele apenas sorria, tinha conseguido o que queria, que ela acordasse, quisesse lutar, continuar a viver.
Nesse momento o avô do garoto aparece, ele parecia calmo e tranquilo, quando entrou eles se acalmaram, mandou o Mark descer um pouco para ele poder conversar com ela, mesmo reclamando muito e não querendo fazer isso aceitou.
Diferente da primeira vez que eles se viram, agora ele não teve medo uma má impressão daquele senhor, que agora parecia tão simpático e confiável. A voz dele, a calma que ele transmitia tudo parecia ajudar a acalmá-la, ele se sentou em seguida pediu para que ela fizesse o mesmo.

Desculpe pelo meu neto, ele deve ter feito alguma piada idiota, não o leve tão a sério, ele faz isso quando esta nervoso e não sabe o que fazer, é muito imaturo para dizer o que realmente quer, disse o velho.

Ela percebeu o que ele havia tentado fazer e sentiu-se um pouco culpada.

Eu não vou dizer que sei como você se sente, eu não sei, ninguém sabe, mas você deve confiar nele, ele é o único que pode ajudar-te. Isso aqui sempre foi bagunçado (ele fala apontando para toda aquela bagunça de livros espalhados), mas não como esta agora. Desde que chegou ontem ele passou o tempo todo aqui, acho que ele dormiu, estava tentando encontrar um jeito de te ajudar, disse o senhor.

Ela apenas concordou com a cabeça. O senhor então levantou-se. Mas antes de sair ele falou para ela uma última coisa.

Meu filho escolheu o nome desta livraria. Um dia quando eu perguntei a ele sobre o porquê dele ter escolhido este nome ele me disse, achava que todos nós em algum momento da vida caímos no inferno, mas este não é o fim, se nos mantivermos firme, se seguirmos em frente, se nos lembrarmos das coisas boas e do que realmente amamos, conseguiremos chegar ao paraíso, o senhor disse.
Você realmente acredita nisso? ela perguntou.
O senhor apenas sorriu e respondeu com uma citação. “A única forma de chegar ao impossível é acreditar que é possível.” – Lewis Caroll

O velho desceu as escadas e em pouco tempo o garoto subiu de novo. Ele ia pedir desculpas a ela, mas quando se olharam nos olhos viram que aquilo era desnecessário. Haviam coisas mais importantes a se fazer.
Ela perguntou se ele tinha alguma ideia de como ajuda-la. Mark disse que tinha uma teoria, uma ideia, mas não sabia se funcionaria. Acreditava que os demônios se aproveitavam e se escondiam em feridas e no vazio do coração das pessoas, então se conseguisse atingir isso poderia conseguir expulsar o demônio sem que ele causa-se danos à pessoa.

Eu sei que deve ser difícil para você falar sobre isso, mas tem de contar se houve algum trauma, alguma coisa que aconteceu e te marcou, você precisa enfrentar isso, ele disse.
Tudo bem, vamos ao cemitério, disse Katherine com uma voz lamuriosa.
O que vamos fazer lá?
Visitar meus pais.

Ele ficou surpreso com aquela resposta. Mesmo tendo acabado de chegar a cidade já tinha ouvido falar sobre o cemitério. Era conhecido como o lugar onde rosas nunca cresceram.  

4 comments:

  1. Gostei do capitulo, esse Mark e o avô parecem entendidos em ocultismo, o que irão fazer no cemitério? provavelmente buscar o passado negro para saber como combater o demónio.

    PS: Adorei a musica e a imagem ^^

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  2. Tô gostando... esperando o próximo!

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  3. Sua fic é muito legal!
    geral pirando no ocultismo!

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  4. Interessante. Gostei bastante do enredo.
    Mas o que realmente me chamou a atenção foi o fato de citar a Divina Comédia. Essa obra é espetacular!
    Você está de parabéns, sua fic é boa!
    Até a próxima!

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