Tuesday 7 May 2013

Capítulo 1 - O que o espelho reflete



Ela acorda assustada, ainda tremendo, outro pesadelo, estão ficando cada vez piores, mais intensos, reais, enquanto tenta abrir os olhos vê pela janela uma manha cinza e sombria, como tudo naquela cidade, como tudo no mundo.
Se apressa e consegue tomar café da manhã antes que os outros acordem, quer sair logo daquele lugar, não quer ter que forçar sorrisos, bem como não quer que eles se forcem tentado fazer parecer que ela é da família, ela e eles sabem que não é.
Antes de sair espia o relógio e vê que ainda são 6:40 h, ainda tem um bom tempo antes de a aula começar, não que ela estivesse com grande vontade de ir a escola, mas se faltasse de novo receberia um aviso e queria evitar de levar problemas para “casa”, ela riu amargamente ao pensar no que essa palavra significava para ela.
Caminhou por uma longa avenida, se distraiu ao ver um caminhão descarregando várias caixas, onde era o antigo antiquário da cidade agora iria abrir uma livraria.
Uma livraria por aqui, deve ser um bom lugar para se ficar sozinha, ela pensou.
Tomou o caminho que passava pelo bosque, enquanto caminhava sentia alguma paz, era a parte da cidade que mais gostava, subitamente sentiu algo diferente, tudo ficou em silêncio, mas parecia haver sussurros, pelo menos foi o que ela pensou ouvir.
Após avançar mais dentro do bosque, sem saber bem o porquê, como se algo estivesse a chamá-la viu um garoto sentado, encostado no tronco de uma velha árvore, por um momento pareceu que tudo pulsava em torno dali, como se aquele fosse o centro daquele bosque ou talvez de todo o mundo.
Mesmo estando na frente dela o garoto parecia não notá-la, na verdade ela até duvidou que ele realmente existisse que tudo aquilo fosse real, até que olhou nos olhos dele, fitavam o vazio, encaravam o nada, pareciam um bonito lago que convidava para que se mergulhasse nele, aquelas águas turvas escondiam alguma coisa, ela sabia que se entrasse ali poderia se afogar.
Não conseguia dizer quanto aquilo tinha durado se cinco segundos ou toda sua vida, mas sentiu medo, correu por algum tempo, sem rumo, sem direção queria apenas se distanciar daquilo que a atraia, se não conhecesse tão bem o bosque teria se perdido. Quando finalmente parou para respirar conseguiu se acalmar, agora tudo aquilo parecia surreal, ela tinha vontade de rir.
Nesse momento ela então olha para o relógio e percebe que esta atrasada para a escola. Ao chegar lá é mandada para a diretoria, faz tempo que ela conhece todo este roteiro, o diretor começa sendo severo, falando sobre o futuro dela, dizendo para ela parar de causar problemas, depois finge que se preocupa de verdade e que não esta apenas a fazer o que é pago para fazer, no fim aquilo tudo é inútil, os dois sabem disso.
Na verdade a própria vida é isto, uma sucessão de hábitos, uma rotina que se arrasta do berço até a sepultura, seguir os trilhos e permanecer na estrada que todos seguem, nada muda, basta ficar parado e se deixar ser levado pela correnteza, entretanto, algumas vezes, o acaso nos desperta deste torpor, aparece alguma coisa que pode mudar tudo.
Ao longe ela escuta uma conversa e vozes se aproximando, pelo corredor a secretária do diretor vem trazendo um garoto até onde ela esta, na sala de espera do diretor.
A expressão dela é um misto de espanto e incredulidade, por mais que ela tivesse visto aquilo com os próprios olhos ainda era difícil acreditar que estava vendo aquele garoto que havia encontrado no bosque. A secretária do diretor fala qualquer coisa mas ela não escuta, só consegue olhar para o garoto que se senta perto dela em um grande banco, instintivamente ela recua um pouco, ele sorri.
Com certeza é a mesma pessoa, mas ela não consegue entender, ao mesmo tempo esta completamente diferente, ele não tem mais aquela aura especial, parece um jovem como qualquer outro.
Ao mesmo tempo em que com um ar descuidado se encosta no banco ele quebra o silêncio e começa a conversar com ela.

- Obrigado, você acabou me ajudando se não fosse por você eu teria chegado ainda mais atrasado, ele diz.
- Então era mesmo você no bosque, quem é você, o que você estava fazendo lá, o que você esta fazendo aqui? (ao mesmo tempo que sente vontade de fazer ainda mais perguntas ela se sente um tanto boba e se cala.)
- Calma, você faz tantas perguntas e ainda nem nos apresentamos, eu ainda não sei o seu nome.

Ela hesita, em responder, ainda parece tudo muito confuso. Ele continua com um sorriso no rosto, como se estivesse a gostar daquilo.

- Muito bem, tem razão em não me dizer seu nome, ainda não me conhece. Você sabe o que é magia? Magia é saber o verdadeiro nome das coisas, quando se sabe o verdadeiro nome de uma coisa ganha-se poder sobre ela.

Nesse momento o diretor aparece e chama-a para a sala dele, chama também o garoto dizendo que aproveitará para ensina-lo como as coisas funcionam naquela escola, que mesmo sendo novato ele deve aprender a seguir as regras.
Muito sério e andando de um lado para o outro da sala o diretor começa a listar todas as faltas da garota, vários atrasos e faltas recentemente, brigas com outros estudantes, discussões com alguns professores.
A jovem ouve a tudo de cabeça baixa, enquanto o garoto ouve a tudo com um discreto sorriso e uma expressão séria, como se se divertisse com aquilo tudo. Ao mesmo tempo ela observa ele pegar uma caneta da mesa do diretor e começar a desenhar alguma coisa na palma da mão.
Muito sério e acentuando bem cada palavra o diretor continuava a falar, ela só conseguia imaginar ele a ensaiar isso na frente do espelho, quantas vezes ele deve ter feito isto, tudo tão mecânico, teatral, se tropeçasse provavelmente esqueceria tudo.
O garoto continuava de cabeça baixa a rabiscar a palma da mão, de repente ele levanta a cabeça e mostra a mão para ela, um rabisco, uma caricatura do diretor, tão bobo, mas ela sorriu. O diretor enervou-se ao ver os dois rindo, decidiu mandar ambos para a detenção, ficariam lá o resto do dia, e ainda durante todo o resto da semana.
A secretária do diretor levou os dois até a sala da detenção, a garota conhecia bem aquele lugar, até não era mal quando você se acostuma, é tão tedioso quanto as aulas, mas pelo menos é silencioso.
É uma grande sala, abafada e escura, se você não prestar bastante atenção nem repara no velho professor sentado lá, vigiando os alunos, tentando fazer daquilo um castigo, no fundo ele não é tão mal, ou apenas não se importa, a cada 10 minutos sai para fumar e deixa os alunos sozinhos.
O silêncio dele a irrita, ela sabe que ele fez aquilo de propósito para eles irem até a detenção, mas por que, ele não parece o tipo que faria isso sem um motivo, ou sim, por um momento ela esqueceu que acabou de conhecê-lo.

Então o quanto você sabe sobre tudo o que esta acontecendo?- ele pergunta
Do que você esta falando, afinal de contas o que você quer comigo? Você aparece aqui do nada me meti em toda esta em confusão e faz perguntas sem sentido,  ela diz.
É você não parece estar mentido, foi culpa minha, eu a superestimei, - ele diz enquanto fita seus olhos. Eu achei que você conseguisse sentir, quero dizer como diabos você foi até mim naquele bosque, eu realmente achei que conseguiria algumas respostas, pelo visto estava errado.
Pare com esse maldito jogo seu idiota, me diga o que esta acontecendo aqui.
Tudo faz sentido agora, devia ter percebido antes, bastou seus sentimentos se agitarem e o maldito bastardo apareceu, não que isso melhore as coisas, na verdade tudo ficou pior.

Ela fica confusa sem entender nada do que esta acontecendo, ele então pede um espelho, relutantemente ela entrega um espelho que guardava dentro da bolsa, neste momento ele tira do bolso um canivete e faz um corte no dedo, com o sangue que escorre do ferimento começa a desenhar estranhos símbolos na superfície do espelho, quando termina então a entrega, mesmo receosa ela aceita.
Quando observa a imagem no espelho um grito de terror, solta o espelho que se fragmenta em milhares de pedaços, quase desmaia mas ele a segura, ao se recuperar ela o empurra, manda ele ficar longe, nunca sentiu  tanto medo em toda sua vida.

Que tipo de brincadeira é essa, o que você fez?, ela pergunta com a voz trêmula.
Você tem um demônio dentro de você, ele calmamente responde.

9 comments:

  1. Foi um bom começo, adoro historias de demónios, que venha o próximo :P

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  2. Primeiro capitulo ficou muito bom, ótimo trabalho manolo! Teve uma melhora sutíl mas notável desde a primeira versão.

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  3. Gostei bastante... conseguiu prender minha atenção, garoto!

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  4. Devo-lhe informar que você ganhou uma fã, Cara vc escreve muito bem!

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  5. Tenho que admitir que a sua história me prendeu do inicio ao fim.Adorei a sua personagem bem realista.Mas quero ver como ela vai lidar com toda essa situação XDD

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  6. James Collings7 March 2015 at 13:29

    Eu comecei a ler agora e já estou empolgado com a Fanfic, vou continuar a ler os outros cap.
    Fanfic excelente.

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  7. Sua história parece ser bem interessante! Continuarei a ler.
    Por algum motivo, essa última parte me lembrou vagamente o filme Espelhos do Medo. Ficou bem legal.
    Parabéns pela fic! :)

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  8. Nossa sua fic ta boa d++, vou tentar acompanhar!!

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  9. Gostei muito da forma como você escreve! Principalmente quanto ao uso de vírgulas, dá para perceber que é um traço seu. Apesar disso, eu chamaria atenção quanto ao excesso desse uso em alguns casos. Por exemplo:

    | Na verdade a própria vida é isto, uma sucessão de hábitos, uma rotina que se arrasta do berço até a sepultura, | seguir os trilhos e permanecer na estrada em que todos seguem, nada muda, basta ficar parado e se deixar ser levado pela correnteza, | entretado, algumas vezes, o acaso nos desperta desse torpor, aparece alguma coisa que pode mudar tudo.

    Pela interpretação que fiz, esse parágrafo quer mostrar dois pontos importantes: 1. o quanto a vida é monótona 2. a mania de se deixar ser levado, sem tentar mudar o rumo e 3. às vezes, algum fator interfere e esse rumo que deveríamos seguir muda.

    São muitas informações importantes para que todas sejam deixadas numa sentença só, apenas separadas por vírgulas, pois isso acaba diluindo a importância de cada fator. É possível combinar as duas coisas, tanto o seu traço da sucessão de vírgulas, quanto dar a importância a cada fato; como você pode ver, separei por partes e sua marca das vírgulas se manteve. Nesses marcadores que eu coloquei, eu trocaria a vírgula pelo ponto.

    Mas é claro, foi só uma dica! Espero que eu tenha acrescentado algo. Esse é o primeiro texto seu que leio, e gostei bastante do final. Parabéns!

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